Caetano Veloso lançou o novo álbum ‘Meu Coco’ nesta sexta-feira (22). Nele, o cantor expõe e reflete questões atuais envolvendo tecnologia e as gerações na música brasileira.
O clipe da faixa ‘Sem Samba Não Dá’ também foi divulgado e conta com citações a artistas atuais como Duda Beat, Djonga, Mc Cabelinho e Baco Exu do Blues.
O cantor também publicou uma carta oficial sobre tudo o que este álbum significa para ele e como foi o processo criativo.
Confira na íntegra:
“Muitas vezes sinto que já fiz canções demais. Falta de rigor?, negligência crítica? Deve ser. Mas acontece que desde a infância amo as canções populares inclusive por sua fácil proliferação. Quem gosta de canções gosta de quantidade. Do rádio da meninice, passando pela TV Record e a MTV dos começos, até o TVZ no canal Multishow de agora, encanta-me a multiplicidade de pequenas peças musicais cantadas, mesmo se elas surgem a um tempo redundantes e caóticas. Há nove anos que eu não lanço álbum com canções inéditas. No final de 2019, tive um desejo intenso de gravar coisas novas e minhas. Tudo partiu de uma batida no violão que me pareceu esboçar algo que (se eu realizasse como sonhava) soaria original a qualquer ouvido em qualquer lugar do mundo. “Meu Coco”, a canção, nasceu disso e, trazendo sobre o esboço rítmico uma melodia em que se história a escolha de nomes para mulheres brasileiras, cortava uma batida de samba em células simplificadas e duras. Minha esperança era achar os timbres certos para fazer desse riff sonhado uma novidade concreta. E eu tinha a certeza de que a batida, seu som e sua função só se formatariam definitivamente se dançarinos do Balé Folclórico da Bahia criassem gestos sobre o que estava esboçado no violão. Com isso eu descobriria o timbre e o resto. Mas chegou 2020, o coronavírus ganhou nome de Covid-19 e eu fiquei preso no Rio, adiando a ida à Bahia para falar com os dançarinos. Esperaria alguns meses?
Passou-se mais de ano e eu, tendo composto canções que pareciam nascer de “Meu Coco”, precisei começar a gravar no estúdio caseiro. Chamei Lucas Nunes pra começar os trabalhos. Ele é muito musical e também é capaz de comandar uma mesa de gravação. Começamos por “Meu Coco”, de que “Enzo Gabriel” é uma espécie de península: seu tema (seu título) é o nome mais escolhido para registrar recém-nascidos brasileiros nos anos 2018 e 2019. À medida que vou fazendo novas canções, me prometo pesquisar a razão de, na minha geração e mesmo antes dela, nomes ingleses de presidentes americanos terem sido escolhidos por gente simples e pouco letrada, principalmente preta, para batizar seus filhos: Jefferson, Jackson, Washington – assim como Wellington, William, Hudson – eram os nomes preferidos dos pais negros e pobres brasileiros. Ainda não fiz nenhum movimento nesse sentido, mas ter esse disco pronto e estar empenhado em lançá-lo me leva a certificar-me de que farei a pesquisa, como se fosse um sociólogo, assim como ter feito “Anjos Tronchos”, canção reflexiva que trata da onda tecnológica que nos deu laptops, smartphones e a internet, me faz prometer-me ler mais sobre o assunto”.